3.
S
Spina Bífida
Os
olhos permitem ver o que a realidade oculta. Por isso a visibilidade é tão
importante. Dá- nos a consciência do lugar próximo que se encontra para além de
nós. Permite-nos a consciência do Outro e, por consequência, a consciência de
Nós próprios.
O que
tem isto a ver com uma malformação congénita designada por Spina Bífida?
Tudo e Quase-Nada.
Esta malformação congénita que parece
significar, de forma concetual direta, que a «espinha» se divide em duas
partes, significa no fundo que as vértebras que formam a nossa coluna
vertebral, que são revestimento e proteção da medula espinhal, cuja formação
ocorre por volta do primeiro mês de gestação num feto saudável, não fecham
convenientemente numa pessoa portadora de Spina Bífida ocasionando fendas entre
as vértebras. Este facto vai ocasionar lesões no sistema nervoso central que
diferem de pessoa para pessoa de acordo com a extensão e o grau das lesões.
O bebé nasce assim portador
de uma lesão não adquirida após o nascimento sendo os danos irreversíveis. O
trabalho clínico prematuro, inicial e continuado, no intuito de prevenir
futuras lesões e de facultar a maximização da qualidade de vida da pessoa
portadora de Spina Bífida adquire importância crucial.
No contexto educativo a situação é semelhante
à situação clínica.
Cabe à Escola complementar, em articulação
com os outros serviços, o trabalho médico, no intuito de permitir que a criança
desenvolva, desde uma idade precoce, as suas capacidades e potencialidades de
forma a otimizar a sua atividade e participação nos diferentes contextos de
vida. A Escola deve, por isso, permitir a construção dum trabalho
transdisciplinar, continuado e articulado, não apenas nas áreas académicas, mas
sobretudo nas áreas da educação especial, da psicomotricidade (motricidade,
coordenação motora, tonicidade, motricidade fina, esquema corporal, organização
espácio-temporal) com, da fisioterapia, das terapias complementares
(Hidroterapia/Psicomotricidade em Meio Aquático, Hipoterapia/Equitação
Terapêutica, Desporto Adaptado,…), com as adaptações escolares e as medidas
educativas necessárias que permitiram a cada criança, jovem e/ou jovem
adulto(a) um desenvolvimento que seja o mais harmonioso possível.
Algumas crianças portadoras de Spina Bífida
apresentam, em comorbilidade, outros problemas de saúde como consequência da
malformação congénita como bexiga neurogénica e hidrocefalia (retenção de
líquido céfalo-raquidiano no cérebro). Estas consequências da Spina Bífida
exigem cuidados de saúde particulares e ocasionam, em diferentes graus,
problemas que a entrada na Escola normalmente acentua. A ausência de um
acompanhamento adequado acentua, habitualmente, a ocorrência de problemas do
foro percetivo, de orientação espacial, de lateralização, de coordenação
visuomotora, de motricidade fina, de atenção, de memorização, de raciocínio
abstrato e cálculo numérico (Garcia et al, 2002; Sandler, 1997; Banister, 1991)
que se podem manifestar em diferentes graus.
O apoio e o acompanhamento especializado
assim como o apoio educativo devem ser facultados de acordo com as necessidades
que cada criança e/ou jovem portador(a) de Spina Bífida. Pelas razões referidas
anteriormente as disciplinas de matemática e as disciplinas que envolvam
desenho e construção como a Geometria/Trigonometria (áreas que exigem esforço
ao nível da visualização), que apresentem problemas ao nível do planeamento
espacial e organização da folha de papel (consequências da disfunção na motricidade
fina) assim como todas aquelas que exijam esforço físico continuado devem
efetuar as adequações curriculares individuais e as adequações na avaliação
necessárias para que cada criança e jovem possa desenvolver harmoniosamente as
suas capacidades e competências.
De acordo com SANDLER (2003), as dificuldades
referidas quando associadas ao esforço que estas crianças e jovens realizam
para tentar acompanhar os colegas são, inúmeras vezes, razão de fadiga e de
desmotivação apresentando impacto ao nível da autoestima e a nível académico
podendo dar início a um ciclo de falhanços e frustrações.
Refere SANDLER (2003) que, a alteração da
perceção visual pode estar, por vezes, na origem de um quadro de défice de
atenção podendo estar associado à desmotivação por dificuldade no processamento
de informação ou simplesmente por estar relacionado com a insatisfação sentida.
Contudo, o que foi referido anteriormente não
deve, em momento algum, ser razão de desistência, falta de exigência ou
desinvestimento na otimização do esforço da criança e/ou do(a) jovem, não lhe
permitindo otimizar as suas capacidades, quebrando o ganho de autonomia e a
construção de uma vida pessoal, familiar e social participada e ativa.
Este é um esforço que, na Escola, tal como no
todo social cabe, em primeira instância, a Todos e a cada Um(a) de Nós.
E é aqui, nesta cooperação ativa de esforços,
que entra o Tudo e o Quase-Nada.
Porque Tudo o que foi dito faz parte
integrante do nosso quotidiano e da nossa existência enquanto seres-humanos que
coabitam e partilham espaços comuns de existência.
E porque o esforço que nos exige a dedicação
ao Outro (e a nós próprios) «custa» Quase-Nada.
João Paulo Amaral
(professor de educação especial), Setúbal, 03 de dezembro de 2015
Fontes:
§
ASSOCIAÇÃO DE SPINA BÍFIDA E HIDROCEFALIA DE PORTUGAL (ASBIHP): http://www.asbihp.pt/wp/;
§
SPINA BIFIDA ASSOCIATION: http://www.spinabifidaassociation.org/.
A
Ver:
§
A DAY WITH SPINA BÍFIDA: https://www.youtube.com/watch?v=6vU6w1FwO0w;
§
SPLIT SPINE: https://www.youtube.com/watch?v=Im-IhZpRgio.
A
VER… E OUVIR:
SHAKE IT OFF: https://www.youtube.com/watch?v=LLUTCix-gog.
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